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Estudo conclui que algumas regiões da Europa não sentiram efeitos da Peste Negra

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Uma equipa internacional, que inclui Carla Sá Ferreira, formada pela Universidade do Minho, concluiu que a Peste Negra não teve um impacto devastador em toda a Europa do século XIV, pois houve regiões em que mal teve repercussão. O estudo saiu esta quinta-feira na revista “Nature Ecology & Evolution” e analisou, em amostras de pólen de 261 locais em 19 países, como as paisagens e a atividade agrícola mudaram um século antes e após aquela pandemia.

A Peste Negra assolou a Europa, Ásia Ocidental e Norte da África de 1347 a 1352, sendo a pandemia mais arrasadora da História, com 75 a 200 milhões de mortes estimadas, e contribuindo para várias transformações sociopolíticas e culturais, como o Renascimento. Através de análises ao ADN, fora identificada a Yersinia pestis como agente causador da peste, mas os impactos demográficos da doença estavam pouco explorados.

“O novo estudo mostra que esses impactos variaram substancialmente de região para região e que é preciso abordagens interdisciplinares para entender as pandemias passadas e presentes”, explica a paleoecóloga Carla Sá Ferreira, um dos 61 autores do trabalho, liderado pelo Instituto Max Planck (Alemanha).

A pesquisa contou também com dados polínicos de Portugal, recolhidos na serra da Cabreira (Vieira do Minho) e no vale do rio Terva (Boticas), com o apoio da Unidade de Arqueologia da UMinho. “Os dados sugerem que a Peste Negra nesta área teve um impacto contido face a outras regiões do centro europeu”, frisa. “Ou seja, os indicadores de cultivo contraíram ligeiramente no século XIV, o que pode refletir alguma mortalidade pela peste, mas também a realidade político-social portuguesa, como a crise dinástica de 1383-85 e as guerras com Castela”, diz a licenciada em História – Arqueologia pela UMinho e doutorada pela Queen’s University Belfast (Reino Unido).

Os dados recolhidos em Espanha coincidiram com os de Portugal, logo a zona ibérica terá sido dos territórios em que a Peste Negra teve menos efeitos, a par das ilhas britânicas e do noroeste europeu. Já na Escandinávia, França, Grécia, Alemanha meridional e Itália central, a atividade agrícola diminuiu bastante naquele período, coincidindo aí com as elevadas taxas de mortalidade registadas em fontes medievais.

Não há um modelo único da pandemia

Esta investigação usa a nova ferramenta Big-data paleoecology, baseada na palinologia, que estuda esporos e pólen de plantas fósseis. Em concreto, a equipa avaliou 1634 amostras de pólen no subsolo para ver as plantas presentes e com que abundância, apurando assim se as atividades agrícolas locais continuaram ou pararam naquela fase ou se houve renovação do coberto vegetal com a redução da agricultura. Mais: analisou-se áreas rurais, quando até aqui se utilizava sobretudo fontes de áreas urbanas, mas mais de 75% da população europeia de então era rural.

Os cientistas concluíram que o contexto sociocultural, demográfico, económico e ambiental influenciou a prevalência, morbidade e mortalidade de Y. pestis em cada região. Isto é, não há um modelo único aplicável a todos os locais por onde aquela peste passou. “As pandemias são fenómenos dinâmicos complexos que têm histórias regionais – vimos isso com a Covid-19 e agora demonstramos para a Peste Negra”, devolve Carla Sá Ferreira.

No futuro, pretende-se aplicar os dados paleoecológicos para entender como as várias variáveis interagem para moldar as pandemias do passado – e do presente. A investigadora, que nasceu há 42 anos em Vieira do Minho e colabora com a Universidade de Maynooth (Irlanda), tem tido também projetos com a Historic Environmental Scotland e a Universidade de Stirling (Escócia).

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